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Pierre Clostermann - Piloto de caça e mosqueiro


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  • Patrono

Eu, além de pesca com mosca, gosto muito de aviões e das histórias dos pilotos de caça nas duas grandes guerras. Não importa o lado. A história é mais importante.

Dia desses, achei na Travessa da Rio Branco, uma edição inglesa do livro 'o Grande Circo', do ás francês Pierre Clostermann, nascido e criado no Brasil.

Já no início do livro, uma supresa. Ao chegar na Inglaterra, o oficial do dia pergunta para que ele trouxe varas de pesca? Pierre Clostermann disse que era a prova de que ele acreditava na vitória final. Caso contrário, as teria deixado no Rio!

Veja só, um francês pescava no antes e no início da Segunda guerra. Qual a modalidade? Em outro trecho do livro, ele diz que está muito quente para ir atrás da trutas.

Um mosqueiro? Sim, a prova surgiu hoje pela manhã, na barca... Um capítulo inteiro do sue livro dedicado a pesca com mosca e uma história trágica e comovente...

Fiz uma tradução livre que estou compartilhando com vocês: conheçam Pierre clostermann, piloto de caça e mosqueiro:

Um encontro no rio

Ao final do mês de abril, eu tinha três dias de folga. Começavam as primeiras eclosões das mayflies, e minha intenção era testar minha sorte com algumas trutas (Jacques também estava envolvido com o seu tipo de pesca, isto é, mulheres). Havia mais e mais conversa sobre um desembarque em junho ou julho, portanto era minha última chance antes do balão subir. Não longe de Detling havia um belo rio, um daqueles ‘chalk streams’, onde cada metro deve ter sido alugado por uma pequena fortuna antes da guerra e guardado pelo dono como se fossem as jóias da coroa. Agora não havia guarda – todos haviam sido convocados, então eu pesquei com um desrespeito pela autoridade genuinamente francês. Eu não estava pescando ilegalmente: eu pescava como um cavalheiro inglês... Eu já havia sido pego pescando com larvas ou colheres ao invés de moscas, e só Deus sabe o que os ingleses dizem desses bárbaros do outro lado do Canal! Nos últimos três anos, eu havia ocupado quase todas minhas folgas na água, e, sou obrigado a dizer, cada vez que foi necessário pedir autorização para pescar, ela me foi concedida, sem exceção. O único problema era o equipamento, e minhas reservas estavam baixas. Em Londres, a vitrine da Hardy’s, o famoso fabricante de material de pesca, estava vazia. O velho e muito digno vendedor atrás do balcão tornou-se um amigo com o passar dos meses; frequentemente ele cavoucava suas reservas secretas para achar uma linha Tortue, uma meada de seda, anzóis simplesmente inencontráveis ou alguma mosca maravilhosa...

E a beleza do rio! O leito coberto de vegetação, os mal-me-queres, os juncos, a tímida saracura, as velozes libélulas e mayflies, uma nuvem de mosquitos apanhada pela luz do sol filtrada pelos galhos das árvores no início da manhã... Havia um senso de paz e maravilhas que fazia a guerra parecer tão distante.

Duas ou três trutas estavam rebojando, observadas por uma plácida garça apoiada em uma perna só, e após dois ou três arremessos eu fui capaz de colocar minha mosca no meio do rebojo feito pelo maior dos peixes. Uma vez que fazia muito tempo que ninguém pescava no rio, as trutas haviam perdido a cautela, e mordiam prá valer. Um grande peixe bateu, e correu rio acima por uns 50 m antes que eu o trabalhasse até cansar. Um segundo veio do mesmo jeito: basta por um dia. Eu enrolei minhas capturas em folhas de menta selvagem; elas perdem o brilho, mas deixam um gosto maravilhoso na carne. Tempo de acender o cachimbo. Sentado em um tronco de árvore, eu releio pela vigésima vez um capítulo do La Boite à Peche de Maurice Genevoix, que, para minha eterna vergonha, eu retirei da biblioteca dos Franceses Livres Voluntários em Bromley South.

Subitamente, sacudindo aquela calma de maneira blasfema, um V-1 passa acima com um ruidoso rugido de uma motocicleta gigante. Poucos minutos depois, eu ouço a antiaérea tentando derrubá-lo antes de ele alcançar Londres. Depois de tudo, não há como escapar da guerra.

E procuro na minha mochila os sanduíches de carne enlatada que as moças da cozinha, candidamente – e sub-repticiamente – prepararam para mim. No exato momento de abrir uma garrafa de bourdeaux comprado em um pub no caminho, eu me dei conta que esqueci meu saca-rolha. E como eu hesitava em quebrar o bico da garrafa, escutei uma voz atrás de mim:

‘Porque você não usa o meu saca-rolha’?

Um homem chegara silenciosamente através da grama baixa, segurando um canivete suíço. ‘Essas trutas estão magníficas. Parabens’.

Setenta anos se tanto, reto como uma vara, com suas polainas, casaco de tweed e bigode branco, ele tinha toda a cara de um general aposentado do antigo exército inglês na Índia, e era mesmo!

Ele sentou ao meu lado e pegou o seu cachimbo. Eu lhe ofereci meu tabaco, ele o cheirou e disse que não gostava do fumo americano, era muito doce. Ele preferia o seu. Deduzi que ele era o dono da terra, mas ele me deixou a vontade e que viesse pescar sempre que quisesse. Ele perguntou sobre mim, intrigado pelo fato de eu ser piloto de caça e, obviamente, francês até as botas. Ele fez dois ou três arremessos com minha vara e declarou que não correspondeu a expectativa: é americana! Isso me pegou de surpresa; por outro lado, ele disse que tinha as moscas perfeitas para o rio e as me daria se eu fosse jantar com ele amanhã. Ele me deu o endereço e explicou-me como chegar lá.

Pesquei o resto da tarde e liberei mais duas trutas. O fim de tarde chegou com uma leve brisa, e precisava deixar meu pequeno paraíso e voltar para a base. Dei uma das trutas para um clérigo que gentilmente me ofereceu carona no seu velho Austin. A outra, o cozinheiro da base fritou, e eu a comi escondido na despensa, totalmente fora da vista dos outros oficiais.

Finalmente, sentei em uma cadeira do refeitório para atualizar meu diário, que estava um tanto negligenciado ultimamente. Comecei descrevendo o adorável dia que passei pescando.

Amanhã, vou aceitar o convite do general.

Depois de pescar no rio e sempre apanhar boas trutas, recebi convites regulares para visitá-lo e fui brindado com o privilégio da sua solitária amizade. Ele usa dois anéis de casamento na sua mão esquerda e uma fita de luto na sua jaqueta. E sempre tem uma garrafa de porto escondida em algum lugar.

Um dia, disse a ele que eu seria condecorado com a D.F.C. (Distinguished Flying Cross). Ele quis sair e buscar um champagne da sua adega, mas recusei. Então, com um pedido de desculpas, ele desapareceu por um momento e retornou com um longo estojo de couro que depositou na mesa na minha frente.

‘Agora elas são suas’.

Com imensa reverência, admirei duas magníficas varas de bamboo: uma para truta, outra para salmão.

Antes de mudar de base, eu quis dizer até logo para o general. Mas, na estão de polícia de Maidstone, vi que havia ocorrido uma tragédia. Uma V-1 defeituosa caiu ao lado da casa coberta com trepadeiras e a destruiu quase que totalmente. Meu velho general está agora reunido com sua esposa, uma enfermeira que foi morta no bombardeio de Londres em 1940. e foi somente ali que soube que seu filho, um piloto de caça e líder do esquadrão 601, foi dado como desaparecido no Canal em 1941. O pai jamais havia mencionado o fato. Foram as varas dele, que ele me presenteara. Admito que chorei naquela tarde enquanto meditava sobre a injustiça do destino.

Tradução livre do capítulo A Meeting by the River, extraido do livro The Big Show, Pierre Clostermann. Cassel Military Paperbacks, 2005, pp. 149-151.

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  • Patrono

Concordo plenamente com você Von Her Nóiman a história dos aviõe de guerra, são apaixonantes, Mustangs, spitfires, zeros, stukas que gelavam o sangue de qualquer mortal, quando acionavam sua sirene de mergulho, o triplano vermelho do lendário Barão,realmente é apaixonante.

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  • 2 semanas depois...
  • 2 semanas depois...
  • 1 mês depois...
  • Mosqueiro

Neumann e demais mosqueiros, no último dia 15 o meu estado completou 50 anos. Na ocasião, o Esquadrão de Demonstração Aérea (mais conhecido como Esquadrilha da Fumaça) fez mais uma de suas belíssimas exibições.

Quasndo o Cap Av - que era o locutor - anunciava um chandelle, um Immelman, um touneau, eu só me lembrava de "O Grande Circo"...

Olhem as fotos e me digam - quem já leu o livro - se não dá para a gente se sentir dentro da história?

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